Rio Sem Velório - Coronavirus altera sepultamento do imortal Afonso Arinos
Faleceu na manhã deste domingo o acadêmico Afonso Arinos de Mello Franco (Afonso Arinos, filho), aos 89 anos. Ele sofreu um infarto. O enterro será nesta segunda-feira (16), às 13h30, no mausoléu da Academia Brasileira de Letras (ABL), da qual Arinos era membro. Diante da recomendação de se evitar reuniões e aglomerações por conta do coronavírus, não haverá velório nem a tradicional cerimônia no mausoléu localizado no Cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro.
Eleito em 22 de julho de 1999, Afonso Arinos foi o sexto ocupante da Cadeira nº 17 da ABL. Ele entrou na sucessão de Antonio Houaiss e foi recebido em 26 de novembro de 1999 pelo acadêmico José Sarney. Era parte de uma família de intelectuais: filho do imortal, ex-deputado e ex-senador Afonso Arinos de Mello Franco, responsável por criar a primeira lei contra o racismo no país; sobrinho-neto de Afonso Arinos, um dos mais importantes escritores sertanistas, e do político e diplomata Afrânio de Mello Franco. Afonso Arinos de Mello Franco também era avô do colunista de O GLOBO Bernardo Mello Franco.
Nascido em Belo Horizonte (MG) em 1930, Afonso concluiu o curso de Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais na Faculdade de Direito da Universidade do Brasil, atual UFRJ, nos anos 1950. Foi embaixador na Bolívia, Venezuela, Santa Sé e Holanda. Também atuou na política, elegendo-se deputado estadual, e, posteriormente federal, do então Estado da Guanabara, na década de 1960.
Por conta da vida diplomática, Afonso Arinos viveu em 11 países, esteve com presidentes, ministros e com o Papa João Paulo II.
Paralelamente à atuação como diplomata e político, Afonso Arinos também era escritor, com 13 livros publicados, como "Introdução ao Brasil holandês" (1995) e "Pelo sertão: histórias e paisagens" (2006).
— Sou um memorialista — disse ele em entrevista ao GLOBO, em 2013, na ocasião do lançamento de "Tramonto" (Editora Objetiva), seu livro de memórias.
No prefácio de “Tramonto” (que quer dizer pôr do sol em italiano), o colunista do GLOBO e também membro da ABL Merval Pereira, numa referência às histórias vividas por Afonso Arinos, diz que “tamanha delicadeza de alma condiz bem com a narrativa de uma vida plena de realizações, que o colocou não por acaso nos principais acontecimentos do país e do mundo”.
No Itamaraty, Afonso conheceu Vinicius de Moraes, de quem se tornou amigo ao dividir a mesma sala de trabalho. Os dois eram tão próximos que Afonso acompanhou o poeta num bar no Posto 6, em Copacabana, para comemorar, em 1953, o nascimento da filha Georgiana de Moraes. Foi Vinicius quem apresentou Affonso ao poeta e também diplomata João Cabral de Melo Neto, de quem também viria a ficar próximo.
Também estabeleceu laços de amizade com importantes nomes da literatura brasileira, como Paulo Mendes Campos e Rubem Braga, entre outros.
"O embaixador Afonso Arinos de Mello Franco foi um memorialista de águas cristalinas. Dotado de profunda intuição, compreendeu, como poucos, o sentimento do tempo: a longa duração diante da impermanência", escreveu o presidente da ABL, Marco Lucchesi. "Foi também um ensaísta primoroso, arguto e sutil. Escreveu sobre dois amigos notáveis: Vinicius de Moraes e Guimarães Rosa. Afonso foi um historiador atento às raízes do Brasil, com larga erudição, além de profundo italianista. Conhecia bem Dante e Varnhagen, Machado e Manzoni. Perco um amigo querido. Um homem probo e severo. Um grande brasileiro."